Mudança no preço de referência do petróleo no Brasil pode afetar projetos, diz advogada
A ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis) revisou os critérios para fixação do preço de referência do petróleo (PRP), adotado no cálculo das participações governamentais (royalties e participação especial).
Para uma advogada ouvida pela BNamericas, a mudança pode impactar a economicidade dos projetos de produção e resultar em judicialização.
A nova resolução da agência entra em vigor em 1º de setembro de 2025 com efeitos sobre a produção do mês – e com impactos já na distribuição de royalties de novembro.
A proposta de revisão da ANP foi motivada pela alteração da especificação dos combustíveis marítimos no âmbito da Organização Marítima Internacional (IMO), pela regulamentação IMO 2020, que determinou novos limites máximos de teor de enxofre dos produtos, incluindo o óleo combustível marítimo.
Essa alteração impacta no PRP porque, no seu cálculo, é usada a média mensal do preço do petróleo Brent, ao qual se incorpora um diferencial de qualidade (positivo ou negativo) visando adequar o preço à sua qualidade. Ou seja, se o petróleo de determinado campo for de melhor qualidade, o seu preço de referência aumenta; assim como, se a qualidade for inferior, diminui. Para fazer essa comparação de qualidade, são usados derivados, como gasolina, diesel e óleo combustível, que sofreu a alteração nos padrões de qualidade pela IMO.
A IMO 2020 reduziu o teor de enxofre do óleo combustível para navios, em algumas localidades, de 3,5% para 0,5%, acarretando transformação no mercado internacional de óleo combustível. Por isso, a nova fórmula adotada pela ANP irá utilizar ambos os padrões de qualidade, fazendo uma ponderação que utilizará os preços do óleo combustível com 0,5% e com 3,5% de enxofre (50% cada), já que ambos permaneceram sendo comercializados no mercado internacional.
Maria Amélia Braga, sócia do TAGD Advogados, entende que o novo PRP pode alterar substancialmente a carga financeira assumida pelas empresas sem qualquer modificação nas condições técnicas, econômicas ou contratuais originais.
“Isso, por si só, já tensiona o princípio do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, especialmente no regime de concessão, cujos termos foram firmados com base em premissas anteriores, agora abruptamente modificadas por ato infralegal,” disse ela à BNamericas.
Para Braga, essa situação se agrava quando considerada à luz de uma recomendação recente do Tribunal de Contas da União (TCU), que defende o aumento da cobrança sobre grandes campos de produção, visando ampliar a arrecadação da União.
“A adoção simultânea de diretrizes que alteram a sistemática de cálculo do preço de referência e de recomendações para aumentar a tributação no setor transmite ao investidor uma forte sinalização de instabilidade regulatória,” alertou a advogada.
A advogada entende que a probabilidade de questionamento judicial ou arbitral é relevante, sobretudo se for constatado que a nova metodologia promove um descolamento da realidade comercial específica de determinados tipos de petróleo produzidos no Brasil.
“Não se trata de oposição à atualização do preço de referência em si, mas da forma abrupta como essa atualização vem sendo implementada, sem contrapartidas, mecanismos de reequilíbrio ou respeito aos princípios contratuais.”
A Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo e Gás (ABPIP) ainda está avaliando os possíveis efeitos da revisão dos critérios para fixação do PRP.
“De um modo geral, saiu dentro das expectativas que já tínhamos, mas teremos ainda de observar algumas situações mais específicas, casos em que pode haver maiores variações”, comentou à BNamericas o presidente da entidade, Márcio Félix.
O IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás), que representa as grandes petroleiras, também está avaliando o alcance e impactos da medida, conforme revelou à BNamericas seu presidente, Roberto Ardenghy.
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