Filas por combustível expõem gravidade da crise econômica na Bolívia | Blogs | CNN Brasil
Viaturas policiais, táxis, caminhões de coleta de lixo. Não tem distinção: na Bolívia, motoristas de todos os tipos de veículo têm enfrentado horas de fila para conseguir gasolina ou óleo diesel.
Ao redor das cidades e em estradas, as filas de carros, ônibus e caminhões à espera de abastecer são quilométricas. Segundo moradores de La Paz, a escassez se acentuou nos dias anteriores ao segundo turno das eleições presidenciais deste domingo (19).
Neste sábado, o taxista Reynaldo Campos entrou na fila de um posto de gasolina às sete horas da manhã e após mais de cinco horas não tinha conseguido abastecer.
“Está muito complicado conseguir combustível aqui, e em municípios vizinhos. Todos os postos têm quilômetros de filas”, conta à CNN.
No mesmo posto de La Paz, Edson Veizaga, funcionário de uma importadora, contou ter visto vários carros chegando empurrados por motoristas que não conseguiram abastecer antes de a gasolina acabar.
“Tenho evitado sair, para economizar gasolina e só abastecer no fim de semana”, revela ele, após esperar cerca de quatro horas na fila.
Em postos estatais, além dos carros, há filas de pessoas esperando com galões para conseguir combustível. Para isso, precisam levar uma autorização pedida online, e só podem comprar cinco litros por dia.
Thalia Chavez, vendedora de produtos amazônicos, teve que fazer fila dois dias consecutivos com seu galão para comprar gasolina. “Como estamos na véspera de eleições, deram preferência para ônibus que iam para outros municípios, por isso não conseguimos comprar ontem”, disse.
“É exaustivo. Aqui em La Paz às vezes a gente espera uma hora e meia e consegue gasolina, mas de onde sou, no departamento de Beni, as pessoas esperam dois, três dias, e até uma semana, dormindo na fila para conseguir. Fora a especulação que isso gera, de gente vendendo combustível mais caro”, relata.

Nesta semana, o ministro de hidrocarbonetos do país afirmou que o estoque de diesel era suficiente para menos de um dia, enquanto o de gasolina, para três. Mas, segundo ele, navios com combustível chegarão ao país na semana que vem.
A Bolívia importa quase toda a gasolina e óleo diesel que consome, mas vive uma aguda escassez de moeda estrangeira devido à queda na produção e exportação de gás natural.
A atividade extrativa geral do país caiu 12,98% no segundo trimestre. No primeiro semestre deste ano, o país teve a primeira recessão em quase quatro décadas, com uma taxa negativa de crescimento de 2,4%.
A escassez atinge vários setores essenciais para o dia a dia da população. Motorista de um caminhão de coleta de lixo, Leocadio Apaza, disse que em algumas semanas que não conseguiam combustível, menos veículos foram colocados nas ruas, e não puderam cumprir o cronograma do serviço.
“Faz 20 anos que trabalho com coleta de lixo em La Paz, e nunca vi uma situação assim”, garante.
Outro setor afetado é o alimentício. No começo da semana, a CAO (Câmara Agropecuária do Oriente) afirmou que a falta de combustível paralisou a produção, e pediu ao futuro presidente uma solução definitiva para o problema.
Adicionalmente, a escassez tem impacto nos preços, piorando outra dor de cabeça dos bolivianos: a inflação, que chega a 23,32% anuais.
“Já estamos nesta crise há quase um ano. Em 2024, chegou num ponto em que a YPFB [empresa pública de petróleo e derivados] admitiu que já não estava conseguindo realizar os pagamentos de importação de gasolina e diesel e afirma que haverá escassez”, explica a cientista política Lily Peñaranda.
Segundo ela, o nível de escassez variou, desde então, de acordo com a disponibilidade de dólares, e inclusive da venda das reservas de ouro do Banco Central do país.
Tanto o senador e ex-prefeito Rodrigo Paz, do Partido Democrata Cristão, como o ex-presidente Jorge “Tuto” Quiroga, da Aliança Liberdade e Democracia (Libre), afirmam que o combate à escassez de combustível é uma prioridade.
A diferença de ambos está na abordagem: enquanto Quiroga defende contrair imediatamente um empréstimo do Fundo Monetário Internacional para obter as divisas necessárias para a compra de combustível, Paz afirma que o país já têm créditos de organismos de cooperação à espera de aprovação pelo Legislativo e que pretende usá-los.
Agora, os bolivianos se consolam na esperança de que o futuro presidente do país contorne a situação, embora saibam que a solução não será imediata.
“Não acho que isso seja resolvido imediatamente. Acho que vai demorar um ou dois anos, independente de quem ganhar”, diz o taxista Juan Manoel Peña.
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