Devedor Contumaz: Senado impõe capital mínimo e titularidade comprovados para combustíveis
Gabriel Vasconcelos, da Agência iNFRA
O PLP 125/2022, que cria o Código de Defesa dos Contribuintes e tipifica a figura do devedor contumaz, foi aprovado no Senado com trechos específicos para o setor de combustíveis. O principal deles é a obrigação de aportes mínimos definidos pela ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), na forma de capital social, para que as empresas possam iniciar as atividades de revenda, distribuição e produção de combustíveis líquidos.
Sobre isso, o texto absorve e amplia trecho da lei de 1997, que regula essas atividades. Para fontes do setor, serão necessárias revisões da ANP para torná-lo mais consequente no em linha com o espírito da nova lei. Interlocutores do mercado também lamentaram o não acolhimento das emendas que propunham a monofasia de impostos sobre a nafta, vista como solução para frear a sonegação envolvendo esse insumo, que serve à formulação de gasolina. O texto segue para a Câmara dos Deputados, onde ainda pode ser modificado.
De forma mais ampla, para toda a economia, o PLP 125/2022 aumenta as penalidades contra empresas que devem mais de R$ 15 milhões e não pagam impostos de maneira “substancial, reiterada e injustificada”, por quatro meses seguidos ou seis meses dispersos no período de um ano. Na sessão da noite desta terça-feira (2), o relator do projeto, senador Efraim Filho (União-PB), acolheu quatro emendas integralmente e oito parcialmente.
Entre as últimas estava a proposta da senadora Tereza Cristina (PP-MS), para criação de um novo cadastro nacional de devedores contumazes pelo governo federal. Sob o argumento de maior economia, a ideia foi absorvida no artigo 16 do texto, mas como função da Receita Federal, com divulgação dessa lista em seu site e no as administrações tributárias de estados, municípios e Distrito Federal. Produtores, distribuidores e varejistas de combustíveis enquadrados pela legislação terão, portanto, seus nomes expostos, assim como a ANP passou a fazer recentemente com as distribuidoras inadimplentes no programa de descarbonização RenovaBio.
Aporte mínimo
No relatório substitutivo de Efraim, há menção direta à operação “Carbono Oculto”, que revelou a inserção do crime organizado, sobretudo PCC, em toda a cadeia de combustíveis. Admitindo a influência do contexto, o senador Efraim incorporou a determinação de capital social pela ANP e acrescentou, como condição para a autorização de funcionamento junto à agência, a “comprovação da licitude dos recursos aportados e identificação do titular efetivo das empresas”.
“Ao inibir a atuação de pessoas interpostas, os chamados “laranjas”, e possibilitar ajustes regionais considerando custos e especificidades, a medida fortalece os mecanismos de controle sobre o setor de combustíveis e mitiga o risco de apropriação do mercado por organizações criminosas”, escreveu o senador Efraim no relatório.
Assim, no artigo 52 do texto substitutivo são incorporados os seguintes valores mínimos de capital social: R$ 1 milhão para revenda de combustíveis líquidos (postos de abastecimento); R$ 10 milhões para distribuição de combustíveis líquidos; e R$ 200 milhões para a atividade de produção desses gêneros.
Sobre a titularidade efetiva das empresa, o texto menciona “controle direto ou indireto”, a fim de ampliar o raio de imputação das dívidas tributárias, mas faz uma concessão no parágrafo quinto, segundo o qual a ANP em colaboração com estados e DF, poderá prever valores menores que os mínimos previstos para observar as “peculiaridades” e a “pesquisa de custos do setor” por região, estado ou Distrito Federal.
Um executivo de grande distribuidora disse à Agência iNFRA que, para a nova legislação atingir seus objetivos, a ANP terá de adaptar sua norma, sobretudo com relação aos aportes mínimos, que estariam defasados. Além disso, a agência terá de incorporar as novas exigências de comprovação.
“Os valores estão aquém da realidade. Para uma refinaria, deveria ser de pelo menos R$ 1 bilhão. A defasagem para o capital social ideal de uma distribuidora é menor, mas ainda existe: deveria começar em R$ 20 milhões, que é o valor de investimento de uma base hoje [tancagem, estrutura para mistura e infraestrutura de transporte]”, diz a fonte.
No púlpito do Senado, Efraim disse que a “medida cirúrgica para o setor de combustíveis aumenta o sarrafo para aventureiros”.
“É o fim da farra de se criar CNPJ só com um pedaço de papel, para praticar crime. A regra geral do direito brasileiro preserva a livre iniciativa. Você tem o direito de criar um CNPJ e tentar buscar o seu negócio, mas como esse setor já está muito absorvido pelo crime organizado, estamos criando a regra de que é preciso ter um aporte inicial de capital. Inclusive para que a Receita, após identificar que se trata de evasão de divisas, tenha um patrimônio conhecido para buscar. Hoje, esse patrimônio evapora mais rápido que o combustível adulterado que [essas empresas de fachada] colocam nos carros”, disse o senador.
Nafta
Não foram acolhidas as emendas dos senadores Izalci Lucas (PL-DF) e Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PA), que buscavam alterar outras legislações por meio do texto em questão para estender a monofasia do IBS, CBS e ICMS para “hidrocarbonetos líquidos derivados de petróleo e hidrocarbonetos líquidos derivados de gás natural utilizados em mistura majoritariamente mecânica para a produção de gasolinas ou de diesel [Nafta]”. A aplicação da monofasia, que já vale para gasolina e diesel, também para produtos como nafta e etanol, é pleito relevante do setor, mas não foi acolhida por fugir do escopo do PLP 125/2022.
A este respeito, Efraim disse que já existe emenda com essa natureza para outro PLP, o 108/2024, que regulamenta a Reforma Tributária. “Isso tem uma implicação que vai além da natureza criminal, e tem natureza negocial. Meu entendimento foi não trazer a emenda para debate neste PLP e permitir que ela possa avançar no PLP 108, relatado pelo senador Eduardo Braga e onde já foi tratada com mais profundidade”, disse Efraim na leitura do relatório.
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